Professor: ser ou estar?
Tem assim de gente que encontro por aí que se diz estar professor, enquanto não consegue algo melhor. Eu, ao contrário, sou professora, justamente porque não vejo nada melhor, pelo menos para mim.
Imagina se eu ia conseguir ser atriz, ficar horas memorizando textos, ensaiando, fazer o espetáculo por semanas e aí ter que esquecer tudo para dar espaço para mais textos? Ou advogada, suando naqueles terninhos, pedindo data vênia? Não sou boa em matemática, então todas as exatas estão descartadas. O prédio cairia em segundos. Aliás, sequer seria erguido se dependesse dos meus cálculos.
Mas, trabalho em uma construção mais delicada: a de seres humanos. E amo estar com pessoas, elevar pensamentos, tocar vidas, realizar sonhos, ensinar e, com tudo isso, aprender continuamente dia após dia.
Acho que nós, professores, trabalhamos nos bastidores da sociedade. Qualquer profissional teve que passar por diversas salas de aula. Entretanto, parece que os holofotes estão apenas para alguns dos atores – médicos, advogados, artistas, engenheiros. Contudo, sabe aqueles nomes pequeninos que aparecem no final de um filme? Então, eles são imprescindíveis para que o espetáculo aconteça – são os figurinistas, roteirista, diretor e inúmeros outros.
Acho que esse é o papel do professor. Em uma greve, ninguém nota tanto quanto a greve dos garis ou dos rodoviários, por exemplo. Não faz falta, não muda a rotina. Ninguém nota tanto. Bem, só algumas mães que não aguentam seus filhos em casa. Fora isso, tudo normal.
Ah, mas experimente uma sociedade sem professores, sem alguém que ensine, que ilumine, que guie. Em pouco tempo, acabam-se as outras profissões. Em pouco tempo, impera a bestialidade.
Ser professor é responsabilidade demais para se estar de passagem enquanto não encontra nada melhor para fazer. Lidamos com vidas, esbarramos em ou provocamos mais sonhos, fazemos trabalho de formiguinha nessa imensa construção do ser humano, como cidadão, ser pensante – sim, até criamos os monstros que nos criticam na mídia ou na política, por exemplo.
Apesar da não valorização do magistério, tenho pena de quem está na superfície da profissão, “dando” aula, vivendo de contracheque a contracheque, nesse exercício de “estar” professor. E tem gente que vai “estando” professor até a aposentadoria...
Como é bom mergulhar de cabeça, deixar que esse ofício – ainda que de bastidor – envolva-nos completamente. A gente assiste a propagandas comerciais e já pensa na aula de amanhã, vai ao cinema e volta com ideias para aulas. Fazemos conexões com o mundo através da nossa profissão. Como é bom que nosso ofício faça parte de nós e transforme significativamente quem somos. Como é bom ser. Assim, puro e simples. Ainda que nos bastidores. Afinal, os melhores espetáculos só acontecem graças aos bastidores.