Solimar Silva
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Textos
Descanse em paz!
 
Sabe quando na noite anterior, você quase anuncia com trombetas e faz publicar decreto: amanhã, não levanto antes das dez! Pois bem. Sábado passado foi um dia desses. Depois de acordar cedo a semana inteira, achei muito merecido descanso. E fui dormir com aquela sensação boa de não ter hora para acordar no dia seguinte para minha corrida de três turnos de aula seguidos.
Seis horas da manhã. Telefone toca.
Primeiro o barulho se mistura com seja lá o que for que você está sonhando. Pode ser um apito estranho do trem, a sirene da ambulância, a campanhia da mansão onde você mora (no sonho, claro) ou até mesmo o celular dos sonhos.
Como o toque é insistente, você fica naquela fase estranha do sono em que você diz: eu sei que estou sonhando, mas se eu abrir os olhos agora vou até conseguir trazer coisas do sonho para minha cama neste instante. Ah, agora vou conseguir!
O telefone continua tocando.
A essa altura, já acordei muito mal humorada. Afinal, é sábado! Nem durante a semana alguém ousa ligar tão cedo! Bate uma pontinha de arrependimento. E se for algum parente que faleceu e precisam comunicar? Ah, mas se já morreu, não podiam esperar para falar um pouco mais tarde?
Enquanto caminho devagar para a sala, esperando que o telefone pare de tocar, vem um pensamento que me faz correr: se for algum amigo ou familiar em perigo?! Como não pensei nisso antes?
Atendo o telefone solidária:
– Alô?
– Monique? – uma voz de mulher.
- Hã? – eu não acreditei.  – Não tem nenhuma Monique aqui. – respondi quase que entre os dentes.
Ela desligou sem sequer pedir desculpas pelo incômodo.
Volto para a cama. Quero dormir! Ainda posso ter umas quatro horas de sono à vontade. A cama ainda está quentinha, me enrosco no edredon e fecho os olhos.
Toca o telefone.
– Ah, não acredito. Vou fingir que não estou ouvindo. – já não sei se pensei alto e falei baixo. Coloco o travesseiro no ouvido para abafar o som.
Não adiantou, claro.
Tive que levantar de novo. Por que não levei logo o telefone sem fio para o quarto?
Atendi o telefone, mas nem tive tempo de dizer “alô” dessa vez.
– Monique? – a mesma mulher.
– A senhora ligou errado. Não tem nenhuma Monique aqui. – tentei ser bem educada.
Novamente desligou o telefone sem falar nada.
Voltei para o quarto, nem sei por que levei o telefone ao invés de desliga-lo, simplesmente. Acho que é vício do mundo moderno. A gente se sente meio ilhado, sozinho, desprotegido, sei lá, quando não tem todos os nossos meios de comunicação ligados e perto de nós.
Terceira vez. Mesmo número. Vou deixar tocar.
Uma. Duas. Três. Quatro vezes. Que mulher insistente! A essa altura, já perdi o sono. Atendo, mas fico muda.
- Monique? Monique?
Desliga.
Isso se repete umas quatro vezes. A mulher não desiste. Estou quase dizendo que sou a Monique, pedindo desculpas pela brincadeira e pegando o recado. Deve ser importante. Quem sabe, até procuro a Monique para dar o recado diretamente. Mas, só depois que eu terminar de dormir o tanto que eu queria.
Umas seis vezes depois, decido atender e falar:
- Funerária Só Falta Você, bom dia!
- Monique?
- Não. É da funerária Só Falta Você!
- Ah, deixa de brincadeira, Monique.
Desligou de novo. Mas, ela é mesmo insistente. Ou burra. Ligou de novo.
- Funerária Só Falta Você.
- É da funerária mesmo, moça?
- Sim, pois não. Quer encomendar um caixão para a senhora?
- Discunjure. Desculpe. Foi engano.
Desligou para sempre. E até pediu desculpas! Ah, se eu soubesse disso antes!
Solimar Silva
Enviado por Solimar Silva em 15/08/2014
Alterado em 08/05/2020
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